Comportamento: ciência ou filosofia especulativa?

Até pouco tempo atrás o paradigma científico nos dizia que o ovo era um grande vilão da alimentação. A ciência de hoje corrigiu o, até então, erro, e afirma tratar-se de um dos alimentos mais completos da natureza. Um dos lados positivos da ciência, que a permite rever conceitos e reavaliar crenças de um passado de tecnologias obsoletas, estudos nebulosos e pesquisas superficiais, é não carregar nomes próprios e mitos como paladinos de verdades eternas. Mesmo porque, não há fatos eternos nem verdades absolutas.
Pergunte a si mesmo qual foi a descoberta, o invento ou a criação mais poderosa do século XX. Pense por alguns minutos, pois não é uma pergunta fácil de responder. São muitos candidatos, principalmente no campo científico como computadores, aparelhos, a internet, antibióticos, a ressonância magnética funcional e naves espaciais. Das criações ideológicas há o espectro humanista do feminismo. Por outro lado, o que descobriram rabinos, psicanalistas, muftis, sacerdotes e mulás que possa ser comparado por baixo com as drogas anti-hipertensivas, a descoberta da neurogênese ou a angioplastia?
Após refletir um pouco sobre as duas perguntas, de onde você acha que virão as grandes mudanças da humanidade: do Estado Islâmico, dos conceitos de Freud, de um pastor evangélico ou de empresas do Google como a Calico, que investe centenas de milhões de dólares por ano em estudos sobre a imortalidade?
O mundo evoluiu e os prognósticos são surpreendentes para o futuro. Você acredita mesmo que no âmbito comportamental os conceitos filosóficos do século XX são mesmo eficazes para lidar com conflitos e dilemas tão atuais, ainda que por métodos dialógicos? As pesquisas afirmam que não. Imagine que Jacques Lacan, Marx e Jung voltassem a viver hoje. Acha mesmo que reafirmariam suas crenças do passado de posse de conhecimentos tão modernos sobre neurociência, genoma, química, física e novas tecnologias?
Se ainda estiver em dúvida, vou lhe dar alguns dados que não são hipóteses, alucinações ou especulações filosóficas, mas pura ciência respaldada por pesquisas de ponta. Você sabia que podemos usar scanners de cérebro para descobrir desejos e decisões das pessoas bem antes delas terem consciência disso? Sabia que equipamentos com eletrodos são capazes de criar alterações imediatas nas emoções e sensações de pessoas e ratos através da estimulação eletromagnética? Sabia que pesquisas científicas mostraram que quando desconectados os hemisférios cerebrais de um indivíduo, cada hemisfério toma uma decisão diferente do outro sobre a mesma coisa? Agora por favor, aponte onde fica o tal “ego indivisível”.
Como seguir com a infindável subjetividade hipotético-filosófica das terapias ancoradas em teses do milenares? Temos que virar a página e usar os conceitos da ciência para promover resultados em alta performance pessoal, desempenho profissional, esportivo, nas relações familiares, transtornos mentais, superação de traumas e mais qualidade de vida. É impossível criar solução se o foco é o problema ou acertar um alvo à frente se miramos para o chão. Ambicionar vencer uma corrida de Fórmula 1 montado numa carroça de boi não parece sequer razoável. Sem considerar o interesse primário da maioria dos que atuam nesse campo, que em geral prima pelo prolongamento da terapia. Afinal, é preciso sobreviver!
Quando a jornalista Sally Adee, da New Scientist, teve sua vida mudada por um experimento científico realizado num simulador altamente tecnológico com o uso do capacete transcraniano, estamos presenciando a evolução da ciência. Quando utilizo processos dialéticos para mudanças pessoais, alto desempenho de profissionais e atletas, evitar convulsões e promover a ressignificação de traumas através de estudos da neurociência, estamos praticando a evolução da ciência. Quando nanorobôs navegam pela corrente sanguínea para desobstruir artérias estamos nos surpreendendo com a evolução da ciência.
Está na hora de sairmos do século XX no que tange a mente humana. Se até o livre arbítrio foi enterrado por estudos modernos ameaçando inclusive o principal pilar do liberalismo, imagine aquela balela freudiana da sexualidade associada a incesto, perversão e transtornos mentais!
A propósito, se você sentir uma forte dor de cabeça, tiver um ataque cardíaco ou fraturar uma perna, pretende primeiramente procurar um filósofo, um aiatolá, o padre de sua igreja ou um médico? Se sua resposta foi o médico, parabéns. Você tem uma boa percepção do valor prático da ciência.
Rodrigo Batalha é autor da Ed. Saraiva Consultor de Alta Performance